Por Tiago Alves, Cofundador e Diretor Comercial da Solar Americas
A evolução do mercado de energia está sendo moldada por várias tendências significativas. A competição no mercado livre está criando preços mais atrativos, o que incentiva clientes a migrarem do mercado cativo para o livre. Além disso, o custo real da rede elétrica (grid) está gerando um contexto ‘multi-solução’ do ponto de vista do cliente, que precisa racionalizar sua cesta de energia como um portifólio de investimento de risco, natureza e prazos variados. A dificuldade de escoamento de energia, por sua vez, está aumentando a motivação para a geração local, impulsionando alternativas como a geração distribuída (GD) e o modelo Behind-the-Meter.
A geração de energia no modelo Behind-the-Meter oferece diversas vantagens. Primeiramente, proporciona maior segurança energética, especialmente para atividades críticas, ao gerar energia diretamente no local de consumo. Isso também traz independência do grid, permitindo a geração de energia sem depender de restrições de conexão. Os créditos de CO2 gerados por essa modalidade de energia tendem a ser mais valiosos, já que não estão contaminados pela dependência da rede de transmissão. Além disso, a geração local pode beneficiar o sistema elétrico ao contribuir para a estabilidade da rede, sendo potencialmente incentivada por isso. Outra vantagem significativa é a escalabilidade do modelo, especialmente quando combinado com sistemas de armazenamento (storage), o que aumenta a utilização do ativo sem custos adicionais.
Marco Regulatório da Geração Distribuída no Brasil
No Brasil, o setor de geração distribuída é regulamentado pela Resolução Normativa nº 482/2012 da ANEEL, que estabelece as condições para que consumidores do mercado cativo de energia elétrica possam gerar sua própria energia a partir de fontes renováveis e injetar o excedente na rede elétrica. Esse marco permitiu o crescimento expressivo de projetos de energia solar no país.
Adicionalmente, a Lei nº 14.300/2022, conhecida como o Marco Legal da Geração Distribuída, trouxe mudanças significativas. Entre elas, está a criação do sistema de compensação de energia elétrica e a previsão de que, a partir de 2023, novos projetos de geração distribuída paguem pela utilização da rede de distribuição, alterando a dinâmica de custos para novos empreendedores no setor. Apesar desses ajustes, o setor continua em franca expansão, onde os projetos de médio porte mostram tendência de crescimento. O modelo Behind-the-Meter, oferece uma alternativa com atrativos adicionais mencionados acima e viável para empresas e indústrias que buscam independência energética e redução de custos operacionais.
Dados Recentes do Setor Energético
De acordo com dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR), o Brasil atingiu a marca de 28 GW de capacidade instalada em energia solar em 2023, com a maior parte desses projetos concentrados na modalidade de geração distribuída. Este número coloca o Brasil entre os 10 maiores países do mundo em geração solar, demonstrando a crescente relevância da fonte renovável na matriz energética nacional.
O setor de energia solar também se beneficia de uma queda constante nos custos de implantação. Segundo a Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA), o custo da energia solar fotovoltaica caiu cerca de 85% na última década, tornando o modelo Behind-the-Meter cada vez mais acessível e atrativo para empresas de diversos portes. Essa queda de custos, aliada à crescente pressão por redução de emissões de carbono, faz com que o modelo se consolide como uma solução fundamental na transição energética global.
Exemplo Prático: Usina Solar da Ambev
Um exemplo prático dessa abordagem é a recém-inaugurada usina solar de 5 MWp da Ambev, uma das maiores, senão a maior, no modelo Behind-the-Meter no Brasil. Localizada em Cachoeiras de Macacu, Rio de Janeiro, a usina entrou em operação em julho de 2023 e é capaz de evitar a emissão de 2.600 toneladas de CO2 por ano. Esse projeto demonstra como a geração solar pode ser uma solução viável em suas diferentes facetas, e sustentável para atender às demandas energéticas de grandes empresas, contribuindo para a mitigação dos impactos ambientais em meio à transição da matriz energética global.
Além disso, em termos econômicos, o modelo Behind-the-Meter pode trazer uma economia substancial para empresas. Estimativas de mercado apontam que projetos desse tipo podem reduzir em até 30% os custos energéticos, tornando-se um atrativo não apenas ambiental, mas também financeiro.
Desafios e Oportunidades do Modelo
No entanto, a implementação do modelo Behind-the-Meter também apresenta desafios. A rentabilização do projeto depende de um investimento de capital (CAPEX) bem planejado e alinhado com uma operação eficiente que empresas especializadas do setor podem tipicamente ajudar ou até realizar o CAPEX, a depender do modelo contratual a ser escolhido. Além disso, existem incertezas operacionais que precisam ser gerenciadas, como medições precisas e otimizações contínuas do sistema. A construção e o dimensionamento adequados da infraestrutura são cruciais para evitar sobrecargas e garantir que o sistema opere com eficiência.
Outra oportunidade envolve a regulamentação em constante evolução, que podem também trazer um modelo que também oferece oportunidades de geração de receita a partir da comercialização de créditos de carbono, um mercado em franca expansão, tanto no Brasil quanto globalmente. De acordo com estimativas da BloombergNEF, o mercado global de carbono pode atingir um valor de 200 bilhões de dólares até 2030, o que pode aumentar ainda mais o valor dos projetos Behind-the-Meter que geram créditos de carbono de alta qualidade.
Em tempos de crise global de energia, com explosão de preços e desafios de suprimento, a energia solar surge como uma resposta eficaz e sustentável para a redução das emissões de gases de efeito estufa e a garantia de segurança energética. No Brasil, o modelo Behind-the-Meter está iniciando e já se mostra uma alternativa promissora para grandes empresas e indústrias que buscam não apenas reduzir seus custos energéticos, mas também contribuir para a descarbonização da economia, em linha com os compromissos ambientais globais.